segunda-feira, 23 de novembro de 2015

Nada é mais perturbador, do que pensar na sujeição sexual indiscriminada, imposta a mulher presidiaria, como a única forma de preservar sua vida.



*Conceição Cinti
Recentemente o Brasil assumiu, normativamente, o compromisso de diminuir com a violência de gênero. A Lei Maria da Penha – Lei 11.340/06, muito mais que objetivar a proteção da mulher contra a violência doméstica, representou avançado vitorioso no sentido de reconhecer que a MULHER É ALVO DE VIOLÊNCIA pelo simples fato de SER MULHER.
E embora muito se tenha obtido favoravelmente à causa com o advento da mencionada Lei, sabe-se que o Brasil ocupa, hoje, o 7º lugar no ranking mundial na violência de gênero. Contabiliza-se 4,4 assassinatos a cada 100 mil mulheres. Um número vergonhoso!
Abordaremos aqui a violência sofrida pela mulher no sistema penitenciário brasileiro.
As condições subumanas das prisões no país não é fato desconhecido. Pelo contrário. O próprio Ministro da Justiça, Eduardo Cardozo, reconheceu publicamente que o sistema penitenciário brasileiro compara-se às masmorras medievais[1].
 No tratamento das mulheres submetidas a cumprimento de pena privativa de liberdade, a situação chega a ser monstruosa!
Em Presos que menstruam¸ obra de Nana Queiroz (Editora Record, 2015), tem-se uma assombrosa noção do que as mulheres passam numa penitenciária brasileira. A negligência já começa na higiene. Mulheres presas recebem o mesmo número de itens de higiene que homens, apesar de usarem o dobro do papel higiênico. Por essa razão, utilizam-se, por exemplo, de jornal velho.
Há também relatos da confecção de absorventes íntimos de miolo de pão! Ou o que? Acreditam que o Estado fornece absorventes para as mulheres presas?
Mas a verdade é que há uma luta constante de uma presidiária por sua vida.
Se os abusos sexuais em prisões masculinas não são raros, imagine-se na penitenciária feminina, onde as detentas, presumidamente mais vulneráveis do ponto de vista físico, abrem mão até de sua vocação sexual natural, comprometendo de forma indelével sua dignidade humana.
A força física e algum status dentro do presídio são instrumentos poderosos que subjugam mulheres e as fazem cativa sexualmente de qualquer um (ou uma), que detenha a força e o poder.
Como o sexo é uma moeda de barganha dentro dos presídios femininos, não há que se falar em estupro ou qualquer outra modalidade de crime sexual contra a mulher presidiária. A mulher dentro do presídio fica absolutamente vulnerável e entregue à força bruta.
Sabemos que todos os presídios brasileiros são uma vergonha nacional no descumprimento aos DIREITOS HUMANOS. Há, como dissemos, excessos também nos presídios masculinos. Mas o que é exceção nos presídios masculinos, é regra no sistema carcerário feminino.
A mulher condenada à prisão no Brasil é impiedosa e duplamente apenada. Ela perde não apenas seu direito de liberdade, mas perde também seu direito à vida. E para evitar que uma tragédia lhe tire a vida tem que fazer concessões, que na maioria das vezes violentam e matam seus sentimentos.
Falência dos sentimentos e emoções é o que consigo imaginar de alguém que diariamente é submetida a uma situação sexual contraria à sua natureza, apenas para poder sobreviver. Esse fato acontece diariamente, diuturnamente, nos presídios femininos, mas é uma barbárie, uma aberração que precisa ser corrigida.  Porque esse tipo de tratamento que é aplicado nas prisões brasileiras, é o mais terrível que um ser humano pode se submeter.
Por uma gestão de gênero, a mulher necessita de mais assistência, que o homem no que concerne a sua higiene pessoal. Por essa razão está sujeita a passar mais privações nos presídios brasileiros. Então percebemos que a mulher tem duas frentes para encarar.
Além de ter que ceder às “carícias e desejos” de qualquer que detenha o poder, ou a força, para sobreviver, luta muito no dia a dia para garantir sua higiene pessoal. A questão da higiene para mulher encarcerada é um item que lhe acarreta mais sofrimento e desconforto que ela tem que lutar para preservar sua saúde. Porém, nada é mais perturbador, que pensar na sujeição sexual indiscriminada, imposta a mulher presidiária, como a única forma de preservar a sua vida.
*Conceição Cinti- Advogada e educadora. Precursora da Educação Restaurativa. Especialista em Tratamento de Dependentes em Substâncias Psicoativas e Delinquência Juvenil, com experiência de mais de três décadas. Colunista do Jus Brasil.

 [1] MARTINS, Luísa. “Presídios do país são masmorras medievais, diz Ministro da Justiça”. O Estado de S. Paulo.  05 nov. 2015. Disponível em: <http://brasil.estadao.com.br/noticias/geral,presidios-brasileiros-sao-masmorras-medievais--diz-ministro-da-justica,10000001226>

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